OZIRES SILVA, A TRAJETÓRIA DE UM GÊNIO

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Revista Época Negócios/Visão. Foto de Mastrangelo Reino

Em 1/8/1896, o povoado do Bahuru foi desmembrado do extinto município do Espírito Santo da Fortaleza (também conhecido como Fortaleza ou Piatã, que ficava entre Agudos e Pederneiras), passando a ser o município de Bauru (“ybá-uru”, “cesta de frutas”, em tupi), tendo como primeiros intendentes José Alves de Lima e Domiciano Silva (à época, ainda não havia o cargo de prefeito). Desde a fundação, a cidade foi predestinada à grandeza, a tornar-se uma cidade líder, uma futura metrópole, pois nasceu para ter uma importância ímpar no Estado de São Paulo, nasceu para ter personalidades das mais diversas áreas – política, saúde, educação, meio ambiente, ciência, empresariado, filantropia, jornalismo, esportes, artes e cultura -, pessoas nascidas ou acolhidas em seu solo fértil de árvores e plantas, vegetações diversas, animais e pássaros povoando uma terra sobre um manancial de águas, o Aquifero Guarani, uma terra – bem antes – repleta de indígenas (tupis, guaranis, kaingangs e xavantes), os donos naturais da imensidão. Pois os pioneiros, desbravadores de São Paulo e Minas Gerais, sedentos de conquistas, ávidos pelo progresso, abriram picadas, expulsaram os indígenas, desmataram e começaram a civilização de um novo tempo.
Durante a administração do prefeito Gerson França, foi construída a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB), iniciada em 1906, ferrovia federal, com a histórica Estação de Bauru, a primeira obra de arte arquitetônica do município, dando início ao desenvolvimento e tornando Bauru conhecida nacionalmente – uma passagem entre o passado e o futuro, abrindo caminhos às inevitáveis industrializações e comércios do século XX. Viria a ser a “Bauru, Cidade Sem Limites!” (verso do poeta Euzébio Guerra, de um poema publicado no final dos anos 50, no periódico “Diário de Bauru”, que tornou-se o “slogan” da cidade). Adiante, o município deixou de ser uma localidade provinciana, para tornar-se uma área estratégica, o entroncamento rodoferroviário do Centro-Oeste Paulista, uma referência regional no que, atualmente, é conhecido como logística. Em 1971, a Ferrovia Paulista S/A (FEPASA), ferrovia estadual, durante a administração do prefeito Alcides Franciscato, fortaleceu o potencial ferroviário, tornando a cidade líder na região.
Já o Aeroclube de Bauru, projetado pelos mesmos engenheiros da NOB, fundado em 1939, foi um dos primeiros do interior de São Paulo, e, por décadas, utilizado como pista principal para voos e decolagens de aeronaves de todos os portes, além da formação de pilotos de planadores, dando uma nova dimensão ao fortalecimento da aviação. (Em 2012, passou a ter a denominação de “Comandante João Ribeiro de Barros”.)
Este fortalecimento confirmou-se com a conclusão do Aeroporto Estadual de Bauru-Arealva “Moussa Nachl Tobias”, em 2006, obra apaixonada do saudoso ex-deputado estadual, Roberto Purini, tribuno por excelência, expoente da política, incansável na luta por um aeroporto fora da zona urbana, que deixou um livro a respeito: “Aeroporto de Bauru – Uma importante conquista” (MG Editora,1998).
A aviação, que teve precursores em outros séculos, revolucionou o mundo, encurtou as distâncias, tornando-se imprescindível à humanidade, a partir do brasileiro Santos Dumont, “o pai da aviação”, o inventor do avião, aquele que realizou o primeiro voo registrado da história, num avião, em 1906. Ao que consta, lamentavelmente, entrou em depressão e suicidou-se em 1932, no Guarujá (SP), desgostoso pelo seu maior invento estar sendo usado em guerras.
No ano anterior, no dia 8/1/1932, em Bauru, nasceu Ozires Silva, o voador dos sonhos, um homem de propósitos, um visionário que ultrapassou os limites da cidade e tornou-se conhecido internacionalmente. As asas do coração levaram-no a procuras e descobertas, uma jornada entre lutas e dificuldades, que possibilitaram inúmeras vitórias significativas e dignificaram o Brasil.
Aos treze anos, disse aos amigos algo profético: que construiria uma fábrica de aviões no Brasil. Manteve esse desejo e, na juventude, alistou-se na Força Aérea Brasileira (FAB), onde conheceu o mundo da aviação e chegou à patente de coronel. Inquieto e obstinado, formou-se em engenharia aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Seu espírito inovador e sua capacidade de liderança levaram-no a liderar a equipe que projetou e construiu o avião Bandeirante. Em 1969, convenceu o governo a criar uma empresa pública destinada à produção de aviões. Tornou-se cofundador e presidente da Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A (Embraer), nome que escolheu àquela que viria a ser uma das maiores empresas aeroespaciais do mundo. Essa conquista foi resultado de sua atuação moderada, que permitiu-lhe transitar entre os segmentos da sociedade e da política, com visibilidade em vários governos militares e civis. Em 1986, com experiência executiva e visão empreendedora, foi designado presidente da Petrobras. Em 1990, foi nomeado ministro do então recém-criado Ministério da Infraestrutura e das Comunicações. No ano seguinte, retornou à presidência da Embraer para coordenar o processo de privatização, que defendia acirradamente, antevendo o projeto do que, nestes tempos, é conhecido como empresa transnacional – grandes corporações com capital milionário, que possuem filiais em diversos países. A privatização foi concluída em 1994, quando a empresa necessitava de capital e investimentos estrangeiros. A economia, carcomida por planos econômicos desastrosos, minou o potencial produtivo da empresa, que foi recuperada e, atualmente, está entre as maiores do ramo. Posteriormente, também foi presidente da extinta Viação Aérea Rio-Grandense (Varig), um dos símbolos do transporte aéreo brasileiro.
De acordo com seu biógrafo, Décio Fischetti, em “Ozires Silva – Um líder da inovação” (Editora Bizz, 2011): “(…) Ozires faz parte da Santíssima Trindade da Aeronáutica brasileira, juntamente com Santos Dumont e o brigadeiro Casemiro Montenegro Filho, criador do ITA. (…)”
Ozires Silva, incansável na vida e no trabalho, no alto de seus noventa e dois anos, após tantas atuações como protagonista de mudanças efetivas no cenário brasileiro, um inovador nato, com vários livros publicados, o “menino de asas” de Bauru, lançou-se no desafio de lutar pela educação superior, levando as bagagens de gestor aeroespacial e de infraestrutura ao meio universitário, como reitor; depois, chanceler (representante), preocupado com a formação de novos profissionais, quando nem todos tem oportunidade de concluir uma faculdade, sobretudo, no início da juventude. A educação é a sua atual bandeira, o fôlego de vida é a luz que envolve suas ideias e projetos, pensamentos e práticas. A determinação é o fortalecimento dos sonhos, o esforço contínuo que leva à certeza, pois o tempo da renovação é sempre. O gênio da aviação é um ser humano exemplar que orgulha Bauru e o Brasil.

 

Elson Teixeira Cardoso, escritor

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