Em nota, empresa admitiu que alteração foi tomada após administração apontar ‘descumprimento do código sanitário’. Antes disso, tema foi polêmica nas redes sociais com vídeo viralizado de moradora e crítica de vereadores; OAB defende manutenção de banheiros ‘multigêneros’.
A unidade de Bauru (SP) de uma rede de fast food que virou centro de uma polêmica por implantar banheiro “multigênero” fez mudanças nas indicações gráficas nas portas de seus sanitários. Segundo a rede de lanchonetes, a mudança foi adotada após a prefeitura da cidade notificar a empresa de supostas irregularidades.
Antes da mudança, havia nas portas, acima da inscrição “WC individual”, o desenho de três bonecos indicando a destinação para homens, mulheres ou pessoas que não se identificam com esses gêneros. Agora, há apenas o desenho de um boneco com a iconografia clássica de indicação para “masculino” ou “feminino”.
Em nota, o Mc Donald’s confirmou que a mudança foi motivada pela notificação imposta pela Prefeitura de Bauru no último dia 13 de novembro apontando “descumprimento de exigências do código sanitário da cidade”.
“A rede reforça que tem o compromisso com a promoção de um ambiente de respeito para que todas as pessoas sintam-se bem-vindas em seus restaurantes. […] No caso do município de Bauru, após a notificação da prefeitura, a companhia fez adequação em atendimento à solicitação das autoridades locais (nº 3832 de 30/12/1994)”, afirmou a nota.
Essa não é a primeira vez que o Mc Donald’s decide mudar o layout de seus sanitários após polêmica envolvendo o conceito de “multigênero”.
Em setembro deste ano, uma unidade de São Roque (SP) fez mudança na placa de um banheiro que indicava a palavra “multigênero” após o caso repercutir em uma unidade recém-inaugurada.
Naquela ocasião, a assessoria de imprensa do McDonald’s informou que o banheiro continua sendo para todos os gêneros e apenas foi retirado o texto por ser uma unidade recém-inaugurada, que é suscetível a mudanças.
Repercussão na web
Na semana passada, um vídeo com críticas de uma moradora ao banheiro viralizou nas redes sociais. Na gravação, a mulher diz que a unidade do MC Donald’s é comunista ao implantar banheiro “multigênero”. O assunto se tornou um dos mais comentados do dia no Twitter
“Eu não admito isso na minha cidade. Não quero usar banheiro com homem, sou contra isso. Eu não aceito. Quero que todos os vereadores de Bauru deem um jeito nisso. Cada cidade cuide da sua cidade, vigiem os banheiros públicos, de restaurantes. Quero que todos vigiem. É um absurdo. Criança usa o mesmo banheiro. É o comunismo na cidade de Bauru. Uma vergonha”, afirma.
As imagens causaram polêmica e dividiram opiniões dos internautas. “Na casa dela os banheiros são separados pra homem, mulher e criança também?, afirmou um.
“Ela é até surtadinha. Mas eu também não quero usar banheiro com homens não”, comentou uma mulher.
Antes dessa repercussão, dois vereadores da cidade já tinham se manifestado contra o banheiro. Após sessão do último dia 8 de novembro da Câmara, eles estiveram no local fizeram a gravação de um vídeo com críticas ao estabelecimento.
Na postagem, o vereador Eduardo Borgo (PSL) comenta que o banheiro serve de pretexto para a não-binariedade. O vereador Serginho Brum, logo em seguida, se manifesta e diz que ficou constrangido.
“Daqui a pouco vira moda isso daí e nossas mulheres e crianças vão ser obrigadas a dividir o banheiro com homens, todos misturados”, diz no vídeo.
Ao g1, a advogada Taylise Rochelli Zagatto, presidente da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB e do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual, em Bauru, disse que os banheiros são relativos a necessidades básicas de cada um e que, por isso, os “multigêneros” não devem ser inviabilizados (veja mais abaixo).
Projeto de lei
Ao g1, Eduardo Borgo salienta que, a princípio, pensa em protocolar um projeto de lei que proíba banheiros “multigêneros” em locais públicos. “Estou buscando se há algo na legislação, por enquanto não encontrei nada, mas, penso em apresentar o projeto de lei para regulamentar a proibição”, ressalta.
Além disso, Eduardo conta que recebeu várias reclamações e comentários de pessoas que foram ao fast food e se incomodaram com o banheiro, alegando questões de higiene.
“Principalmente mulheres reclamam bastante porque o homem urina em pé, e a mulher precisa sentar na mesma tampa que pode conter respingos. Fomos até o local, tiramos a foto e fizemos o vídeo para mostrar o descaso”, diz.
Para ele, o maior motivo do descontentamento está relacionado com a inclusão de banheiro unissex que causa confusão na cabeça das crianças, que entendem que existem banheiros femininos e masculinos separados, e abre precedentes para banheiros coletivos.
“Deixei bem claro no meu vídeo que no fast food são banheiros unissex individuais, mas abrem precedentes para banheiros coletivos, o que seria um absurdo”, comenta.
Já Serginho Brum, procurado pelo g1, preferiu não se manifestar sobre o caso, para além daquilo que já disse no vídeo.
Ações afirmativas
“Ações afirmativas, públicas ou privadas, vocacionadas a combater opressões históricas, sistemáticas e estruturais, como a criação de banheiros “agênero” não devem ser vistas como suspeitas ou indesejadas, mas como imperativos da igualdade em nossa sociedade”, ressalta Taylise Rochelli Zagatto, presidente da Comissão da Diversidade Sexual e de Gênero da OAB e do Conselho Municipal de Atenção à Diversidade Sexual.
Além disso, Taylise comenta que o uso de banheiros por transgêneros, de acordo com o gênero que estes se identificam, encontra amparo nos direitos da personalidade e na dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição Federal.
Ela ainda salienta que na defesa do estado democrático de direito e de uma sociedade plural e diversa, não é admissível que as instituições reproduzam discriminação e comportamentos de um grupo dominante sobre uma minoria.
Taylise também reforça que no Supremo Tribunal Federal (STF) a discussão foi debatida e que os municípios que visavam “a censura no debate sobre identidade de gênero e orientação nas escolas, tiveram a sua inconstitucionalidade declarada pela nossa Corte Suprema”.
FONTE: G1