Nos estúdios de rádio piscaram luzes azuis a avisar os locutores para uma lista de músicas preparada para situações de luto. A estatal BBC ativou um sistema misterioso, preparado para aguentar um ataque à infraestrutura nacional. Com um tom grave, o locutor da BBC, vestido com roupa preta, deu a notícia, começando com “This is BBC from London” (aqui é a BBC de Londres). Eram 18h31 de 8 de setembro, pelo horário local –14h31 pelo horário de Brasília. O hino confirmava o que há muito se receava.
No Reino Unido, as bandeiras foram colocadas a meio mastro e o Parlamento suspendeu as atividades. Uma multidão se aglomerou nas praças e ruas.
Os jogos de cricket, rúgbi e hóquei foram cancelados, assim como as corridas de cavalos. Como a morte foi anunciada depois das 16h (horário local), o National Theatre não interrompeu as sessões da noite. Os especialistas em realeza britânica viram os seus contratos de exclusividade serem ativados para falarem sobre o tema.
O que acontece com o corpo da rainha
Elizabeth II morreu em Balmoral, na Escócia, onde passava três meses do ano. Há, por isso, um cerimonial escocês a cumprir, com a chamada “Operação Unicórnio”.
O corpo da rainha vai repousar no menor dos seus palácios, o Holyroodhouse, em Edimburgo. Em seguida, será transportado ao longo da Royal Mile até à Catedral de St. Giles para uma cerimónia de recepção.
A urna funerária será colocada a bordo do comboio real para um percurso que deve ser acompanhado de milhares de britânicos ao longo de cada lado dos caminhos-de-ferro, com destino ao Palácio de Buckingham, em Londres, a sua principal morada em vida.
Enquanto isso, por todo o Reino Unido –e mais precisamente em Londres– começam os ensaios para o funeral, marcado para o décimo dia após a morte. O luto nacional será demonstrado das mais variadas formas: as televisões, por exemplo, vão evitar programas satíricos. Isso porque há um plano que dita precisamente o que cada um deve fazer.
Os primeiros planos para lidar com a morte da Elizabeth II, conhecidos como “London Bridge”, datam da década de 1960. Foram reformulados no início deste século e implicaram duas ou três reuniões anuais para que todos os envolvidos estivessem a par de tudo.
Esta quinta-feira, 8 de setembro, foi o Dia D, da morte. Os que se seguem são os dias +1, +2 e assim sucessivamente até ao +10, quando se realiza o funeral.
Dia +1: a proclamação de Charles
No dia seguinte à morte da rainha, as bandeiras voltam a subir. Westminster Hall vai ter o chão limpo e coberto de carpetes. Charles, que agora passa a ser o rei Carlos III, será proclamado monarca pelo Conselho de Adesão. A coroação, porém, levará meses, podendo chegar a um ano.
No fim da manhã, Charles III deverá fazer um pronunciamento. O hino nacional vai ser tocado em tambores cobertos de tecido preto. Os arautos, à maneira antiga, espalham a notícia por Londres, entre disparos de artilharia. Nas divisas de Londres, será instalado um cordão vermelho como barreira.
Na agenda do rei está previsto um encontro com a primeira-ministra britânica, Liz Truss. Nos dias seguintes, Charles irá percorrer diversos pontos do Reino Unido, passando por Edimburgo, Belfast e Cardiff, onde receberá cumprimentos dos líderes dos governos descentralizados e assistirá a cerimónias de homenagem à falecida rainha.
Coroação do agora denominado rei Charles III poderá ocorrer em até um ano / Tim Rooke – WPA Pool/Getty Images
Dia +2: corpo será levado para o Palácio de Buckingham
O corpo de Elizabeth II será levado à sala do trono do Palácio de Buckingham, virado para o pátio interior, e cercado por símbolos reais e com honras de guarda, com as espingardas apontadas para o chão.
Dia +3: viagens do rei Charles III
Após receber as condolências em Westminster Hall, o novo rei inicia a viagem pelo Reino Unido, começando pela Escócia.
Dia +4: ensaios
Enquanto Charles estará em viagem à Irlanda do Norte, será feito um ensaio para o transporte do caixão entre o Palácio de Buckingham e o Westminster Hall.
Já longe dos olhares do público, dez pessoas escolhidas para transportar o caixão continuarão com os ensaios. Isso porque os membros da família real são sepultados em caixões com revestimento de chumbo. O da princesa Diana, por exemplo, pesava 250 quilos.
Caixão da princesa Diana, morta em 1997, tinha 250 quilos / Anwar Hussein/WireImage/Getty Images
Dia +5: traslado do corpo para Westminster Hall
O Big Ben irá tocar quando o caixão chegar a Westminster Hall. Serão ouvidos salmos e terá início uma celebração religiosa. O novo rei, estará de volta a Londres para liderar as homenagens. A esfera, o cetro e a coroa imperial são fixados nos respetivos lugares.
Só depois é que as portas se abrem às multidões de pessoas que querem prestar a última homenagem à rainha. O corpo ficará em câmara por três dias. A visita poderá ser feita durante 23 horas por dia. Os convidados VIP têm direito a bilhetes com acesso rápido. Cerca de meio milhão de pessoas são esperadas.
Dia +6: as homenagens
Os ensaios vão continuar, inclusive para o cortejo do funeral de Estado. O novo rei vai dirigir-se ao País de Gales para terminar sua peregrinação pelo Reino Unido.
As famílias convidadas começarão a chegar para o funeral, alojando-se no Palácio de Buckingham. As homenagens nas ruas também deverão continuar, com as vias transformadas em locais de culto. Nos meios de comunicação, seguem com a cobertura planejada durante anos.
Rainha Elizabeth II será velada na abadia de Westminster / English Heritage/Heritage Images/Getty Images
Dia +10: o funeral
É a última etapa do processo de despedida da rainha. Na véspera, as joias reais devem ser retiradas do caixão e limpas. Dia de luto nacional. As lojas devem fechar e as vitrines ficarão repletas de imagens da rainha. Nas ruas, apesar de não haver dispensa do trabalho, multidões deverão participar da despedida. O Big Ben soará às 9h da manhã, pelo horário local.
Duas horas depois, o caixão deverá chegar à Abadia de Westminster, após percorrer poucos metros. No interior, 2.000 convidados. A cerimônia será transmitida para todo o mundo. Ao meio-dia, o país todo ficará em silêncio.
O caixão será levado num percurso de alguns quilómetros em Londres, em uma carruagem militar verde levada pela Marinha Real até ao Castelo de Windsor, onde repousam os restos mortais dos soberanos britânicos.
Os portões serão fechados. O que acontecerá depois será reservado para a família. Depois do serviço religioso na Capela de São Jorge, o corpo desce à cripta. Elizabeth II ficará ao lado do marido, Philip. O novo rei, Charles III, vai soltar sobre a sepultura da mãe terra tirada de uma taça dourada.