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Última grande locadora de filmes de Bauru fecha as portas: ‘Resistimos o quanto pudemos’, diz dona

Alguns comerciantes gostariam que o tempo pudesse ser rebobinado igual às famosas fitas de VHS. Pelo menos esse é o sentimento daqueles que investiram tudo em locadoras de filmes. Entre eles está a empresária Cristina Shibukawa, de 48 anos, que resistiu enquanto pôde para manter a loja, mas que agora optou pelo fechamento.

Antes do apagar as luzes, ver subir na tela o “The End” e fechar a última caixa de DVD, ela e o marido, proprietários da única grande locadora de filmes que ainda tentava sobreviver em Bauru (SP), farão um “feirão” de DVDs neste sábado (27) para dar fim ao estoque.

Mais que uma oportunidade para comprar um filme marcante, o evento será também uma espécie de fechamento de um ciclo histórico no hábito das famílias em alugar filmes.

A Vídeo Express, considerada a última grande locadora de filmes de Bauru, é mais uma a sucumbir a um “pacote” de circunstâncias que minaram esse tipo de negócio.

Em entrevista ao G1, Cristina conta que há 25 anos administra a locadora ao lado do marido. Os sinais de que a vida do negócio não seria tranquila começaram no início dos anos 2000 com o crescimento da pirataria.

Além dos DVDs piratas vendidos aos montes em bancas espalhadas pela cidade, também contribuíram para as dificuldades do setor as mudanças tecnológicas que chegaram no embalo da popularização da TV a cabo e da internet, com os chamados serviços de streaming, como a Netflix.

“Começou com a pirataria, até fizemos um ‘panelaço’ em 2003 como protesto, mas depois veio TV a cabo e a internet, com muita gente baixando filmes. E nosso público foi caindo, caindo… Resistimos o quando pudemos, mas não dá mais”, lamenta a empresária.

No país, o setor sentiu as mudanças, com fechamento de locadoras entre 2006 e 2009 por conta da pirataria e do download ilegal de filmes pela internet, mas chegou a ensaiar uma reação no início desta década, com alta no faturamento em 2011.

Antes das mudanças tecnológicas e de hábito dos consumidores, Cristina e Márcio Shibukawa chegaram a ter dez lojas para locação de filmes espalhadas pela cidade em bairros como Mary Dota, Jardim Progresso, Vista Alegre, Altos da Cidade e Jardim América.

Com o enfraquecimento do ramo, elas foram sendo fechadas uma a uma, juntamente com o fim de outras grandes locadoras, como a de uma grande rede, localizada em área nobre da cidade, na Avenida Getúlio Vargas, que fechou as portas no ano passado.

Até mesmo algumas pequenas locadoras de bairros estão vendendo seus acervos (Foto: Sérgio Pais/G1)

G1 encontrou algumas pequenas locadoras de filmes em Bauru que ainda sobrevivem, a maioria delas localizadas em bairros e com acervo limitado.

Mesmo as pequenas, porém, sentem os efeitos das mudanças tecnológicas – uma delas, localizada no Jardim Bela Vista, também tem uma faixa anunciando a venda de seu acervo.

“Nó na garganta”

Antes do fechamento desta última unidade da rede Vídeo Express, localizada na Avenida Castelo Branco, na zona oeste de Bauru, o casal se despediu em agosto do ano passado da loja que deu início ao negócio, em 1992, localizada na Avenida Nossa Senhora de Fátima.

“A gente sente uma tristeza, afinal é uma vida aqui dentro, a locadora tem a idade de nossa segunda filha. Só quero agora agradecer a todos os clientes que nos ajudaram a sobreviver até agora”, disse Cristina, admitindo um “nó na garganta”.

A balconista Miriam Cristina de Souza diz que vai sentir saudade das amizades que fez com os clientes: “Tristeza é grande” (Foto: Sérgio Pais/G1)

Tristeza semelhante é compartilhada por Miriam Cristina de Souza, de 38 anos, oito deles passados atrás do balcão da locadora. Ela avalia que a pirataria e os “gatos” (ligações clandestinas) de TV a cabo ajudaram a derrubar o negócio de locação de filmes.

“A tristeza é grande com o fim das locadoras, fiz muitas amizades aqui. Sempre indiquei filmes e já até sabia os gostos de cada um. No fim das contas, alguns clientes vinham até mesmo pra desabafar sobre a vida. Vou sentir muita saudade”, diz a balconista.

A professora Simone Fernandes Gomes dos Santos, de 41 anos, é cliente da locadora há pelo menos 16 anos e ainda não sabe o que fará a partir de agora. Ela admite ser uma espécie de “sobrevivente” por manter vivo o hábito de alugar filmes até hoje.

“Quando falo a amigos que ainda frequento locadoras, eles acham estranho. Assisto na internet, vou ao cinema, mas mesmo assim gosto de locadora, um local onde posso acessar rapidamente filmes que perco nos cinemas. Isso aqui faz parte da vida da minha família, um local que venho com meu filho desde pequenino e hoje ele já está com 10 anos. Estou muito triste”, diz a professora.

A professora Simone e o filho Daniel ainda alugaram filmes nos últimos dias de atividade da locadora: “Isso aqui faz parte da vida da minha família” (Foto: Sérgio Pais/G1)

Serviço

O “feirão” de venda do acervo da locadora começa neste sábado (27), às 10h, e deve se estender, na previsão de seus donos, até o próximo dia 10 de fevereiro.

Os preços variam de R$ 2 até R$ 100 (valor, por exemplo, de um box da saga “Senhor dos Anéis”). A média de preços está em torno R$ 10 por DVD. Estarão à venda cerca de 8,5 mil títulos.

Além de todos os filmes (DVDs e blu-rays), tudo da empresa estará à venda, como balcões expositores, cartazes de filmes e material promocional, como três bonecos em tamanho real da série “X-Man”.

A Vídeo Express fica na quadra 16 da Avenida Castelo Branco e a lista completa dos filmes à venda, com valores, pode ser acessada AQUI.

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