Do total, 26 fazem parte de grupos de irmãos e 23 têm mais de 12 anos; na outra ponta da rede, cidade tem 188 pessoas cadastradas como potenciais adotantes, mas “exigências” são entrave
As pessoas estão à procura de “um filho” ou “do filho” idealizado? A provocação lançada por Jociara Araújo, da casa de acolhimento Flor de Liz, sintetiza um dos principais pontos discutidos na Audiência Pública realizada nesta quinta-feira (26/09), na Câmara Municipal de Bauru, que tratou da adoção de crianças e adolescentes. Assista aqui
No encontro conduzido pela vereadora Yasmim Nascimento (PSC), a advogada Tamires Silva de Santana, vice-presidente da Comissão de Família e Sucessões da OAB-Bauru, expôs o descompasso entre a fila de cadastrados com interesse em adotar e o número de meninos e meninas que esperam por uma nova família.
Entre os 129 abrigados em instituições da cidade, 36 já podem ser adotados. Na outra ponta do sistema, 188 pessoas estão aptas para adotar.
Dos 36 adolescentes ou crianças, 26 fazem parte de grupos de irmãos. Dos 10 restantes, um tem sequelas de paralisia infantil e outro é autista. Ainda do total, 23 têm mais de 12 anos; nenhum tem menos de três.
O descompasso pode ser explicado a partir das estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Há, no Brasil, 46.105 pessoas com a intenção de adotar; apenas um pouco mais da metade (23.845) aceitaria filhos de qualquer cor de pele. No mundo, as restrições de “raça” limitam-se a 6% dos potenciais adotantes.
Outro perfil comumente buscado é o de bebês, que não tenham irmãos nem problemas de saúde.
“Está clara a necessidade de, cada vez mais, falarmos sobre esse assunto, buscando meios de desmitificar preconceitos em torno dessa grande responsabilidade, que é a adoção de uma criança ou adolescente”, avalia Yasmim.
Interessados
Vinicius de Carvalho Carreira, também da Comissão de Família da OAB, falou sobre a necessidade de esclarecer o procedimento indicado para as pessoas interessadas em adotar.
Não é necessário constituir advogado. Basta procurar o Setor Técnica da Vara da Infância e da Juventude, no Fórum do Jardim Bela Vista (Av. Afonso Pena, 5-40), para que recebam orientações sobre os documentos exigidos e sejam submetidos à avaliação psicossocial.
Depois, o processo será analisado pelo Juízo para que haja a inclusão no cadastro.
Olavo Pelegrina Junior, presidente da comissão, falou ainda sobre outras formas de colaborar com o desenvolvimento de crianças e adolescentes afastados de suas famílias, por meio do programa “Família Acolhedora”.
Interessados podem procurar as instituições que prestam este serviço pelos telefones (14) 3879-3650 (Fundato) e (14) 3204-9339 (Pequenos Obreiros de Curuçá).
Legislação Municipal
Os vereadores Yasmim Nascimento e Coronel Meira (PSB), também presente na audiência, comprometeram-se a mobilizar discussões com o intuito de alterar a legislação municipal, a fim de propiciar mais respaldo a famílias adotivas. As sugestões partiram de Pelegrina e do promotor de Justiça Enilson Komono, que é pai por adoção.
Uma das mudanças diz respeito à Lei Municipal de 1998 que garantiu o direito de isenção de IPTU a famílias que têm a guarda de crianças e adolescentes. O benefício, entretanto, é suspenso quando (e se) o processo de adoção é concretizado.
Outro item é o que versa sobre as licenças para pais e mães por adoção que sejam servidores municipais. Em acordo com súmula do Supremo Tribunal Federal (STF), é necessário abolir diferenças do tempo de afastamento, instituídas por critérios relacionados à idade da criança adotada.
“Às vezes, é muito mais difícil a adaptação de um adolescente do que uma criança menor e isso não é considerado”, pontuou Enilson.
Mobilizar
Meira propôs o desenvolvimento de ações que promovam o contato de grupos com as crianças e os adolescentes abrigados, por meio de visitas, inclusive de filhos e filhas dessas pessoas.
O vereador relatou experiência bem-sucedida que conheceu em uma instituição de Araçatuba (SP). “Costumavam ir grupos de funcionários de empresa e, quase sempre, havia um ou dois casos que resultavam em adoção, mesmo que inicialmente não planejada. Conheço a história de um policial, que vivia com a esposa e dois filhos em condições bastante modestas, e acabou adotando uma criança cadeirante”.
Também participou da Audiência Pública o secretário municipal do Bem-Estar Social, José Carlos Fernandes.
Rose Orlato, do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), explicou o funcionamento da rede de proteção e todos os trâmites que antecedem o encaminhamento de crianças e adolescentes para possível adoção.
Segundo ela, isso só ocorre quando são esgotadas todas as possibilidades de reintegração às famílias.