Dólar no maior valor em mais de quatro anos e juros pressionados são sinais de descontentamento do mercado com os rumos fiscais
A recente disparada do dólar ao maior patamar desde março de 2020 é um dos sinais do temor do mercado na promessa do governo federal em equilibrar as contas públicas.
A divisa norte-americana encerrou a sexta-feira (1º) negociada a R$ 5,86, patamar que começou a escalar desde o início da semana após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciar que o tão aguardado pacote de ajustes não tem data para ser apresentado.
A forte desvalorização do real não foi o único sinal de descontentamento do mercado com os rumos das contas públicas. O estresse também se manifestou nos juros futuros, que voltaram ao patamar de 13% pela primeira vez desde o início do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Confira abaixo 5 sinais de risco que o mercado vê para as contas do governo federal:
1 – Dólar dispara
A divisa norte-americana foi ao maior valor em quatro anos na última semana e meio ao clima de incerteza com o que o governo deve anunciar como ajuste fiscal.
Há semanas o mercado financeiro aguarda por um anúncio do governo federal para a contenção de gastos, sinalizado para ser levado pela equipe econômica ao presidente após o segundo turno das eleições municipais, findado neste domingo (27).
Para Luciano Costa, economista-chefe da Monte Bravo Corretora, a falta de certezas com as contas públicas prejudica a situação do país.
“O governo começou a semana dando sinais de uma discussão mais estrutural sobre medidas de contenção de gastos, porém a percepção de que as medidas não seriam anunciadas tão rapidamente como o mercado imaginava começou a gerar um desconforto”, diz.
A escala se manteve nos dias seguintes, culminando com o patamar de R$ 5,86 visto na sexta. Desde o início do ano, a divisa já soma mais de 20% de valorização contra o par brasileiro.
2 – Bolsa brasileira entre as piores do mundo
O mau humor do mercado acumulado ao longo dos últimos meses refletiu na desvalorização da bolsa brasileira.
Em uma lista de 20 mercados, o Ibovespa amarga a segunda maior desvalorização em dólar, com queda de 19%, ficando à frente apenas do mexicano IPyC, que perdeu 25,46% no período.
Além das tensões globais com a disputa pela Casa Branca e próximos passos dos juros nos Estados Unidos, o que deixa o Brasil tão abaixo são incertezas observadas no nosso cenário doméstico, segundo Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.
Os principais pontos destacados pelo analista são os juros elevados no país e a situação fiscal do país.
“O fluxo deixou de entrar, o que acaba colaborando para nosso mercado ter um desempenho pior. O grande ponto é justamente a deterioração do macro, que levou a nossa bolsa a ter uma performance ruim”, diz.
3 – Juros em 13%
A falta de perspectivas para a política fiscal do governo Lula também influenciaram na curva de juros, com taxas passando de 13% pela primeira vez em quase dois anos nesta sexta.
Alguns trechos da curva passaram a mostrar taxas próximas de 13,30%, algo que não era visto desde março de 2023, ainda no início do terceiro mandato de Lula, quando ainda não havia clareza sobre a política fiscal a ser implementada pelo governo.
A taxa do DI para janeiro de 2025 — que reflete as apostas para a Selic no curtíssimo prazo — fechou em 11,32%, ante 11,281% do ajuste anterior. A taxa do contrato para janeiro de 2026 marcava 13,08% ante 12,796%.
Entre os contratos mais longos, a taxa para janeiro de 2028 encerrou em 13,24%, em alta de 31 pontos-base ante o ajuste de 12,98% da véspera, e o contrato para janeiro de 2033 tinha taxa de 13,04%, ante 12,81%.
Na sexta-feira, títulos atrelados ao IPCA com vencimento em 2029, as NTN-B, já estão pagando juros reais de 6,99% ao ano.
“A incerteza fiscal e a preocupação com a credibilidade do governo em implementar cortes robustos alimentam a pressão sobre os juros. Em resumo, o clima de insegurança tanto local quanto global está impulsionando a valorização do dólar e a elevação das taxas de juros futuras”, diz Christian Iarussi, especialista em mercado de capitais e sócio da The Hill Capital.
4 – Aumento de gastos
O aumento dos gastos públicos e promessas do governo para ajustar as contas forçam a carga de mau humor dos mercados.
A nova regra de gastos públicos, aprovada em 2023, deu fim ao teto de gastos. A partir de então, as despesas do governo podem crescer entre 0,6% — em períodos de retração — e 2,5% — em momentos de expansão — acima da receita do ano anterior e com valores corrigidos pela inflação.
Dentro da banda, os gastos poderão crescer até 70% da variação da receita do ano anterior.
A questão é que uma série de despesas do governo têm crescido acima desse parâmetros, especialmente gastos obrigatórios. Economistas alertam que essas despesas têm tomado trajetória que indica crescimento persistente, o que ameaça diretamente a sustentabilidade do arcabouço fiscal.
“Se você não desacelera, não torna compatível o crescimento das despesas com o total. O que acontece, inevitavelmente, é que essas despesas vão acabar com o espaço do orçamento, e assim você perdeu o controle sobre a máquina pública”, afirma Gino Olivares, economista-chefe da Azimut Brasil Wealth Management.
Nesse sentido, uma das necessidades de revisão apontadas pelos especialistas são os benefícios cujos valores são reajustados conforme o salário mínimo, atualmente em R$ 1.412.
5 – Dívida pública
A trajetória da dívida pública do país também acendeu o alerta nos mercados. Em agosto, o montante subiu mais do que o esperado, a 78,5% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados do Banco Central (BC). No mês anterior, o indicador estava em 78,4%.
E a expectativa não é de melhora. Estudo do Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado aponta dificuldades do governo federal na sustentabilidade dos gastos públicos mesmo com a melhora na previsão do crescimento do país.
Segundo novo Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF), publicado ao fim de setembro, a dívida bruta do governo federal, que inclui União, estados e municípios, deve alcançar 80% ao fim deste ano.
“O crescimento insustentável da dívida pode comprometer o espaço fiscal do país [possibilidade de ampliar gastos e investimentos], aumentando o risco de uma crise de confiança ou a necessidade de ajustes fiscais mais rigorosos”, diz o RAF.
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