Mais um dia cansativo. São seis horas da tarde e, após um dia estressante no trabalho, a única coisa que você quer é chegar em casa e descansar. Mas conforme o ônibus avança aparecem no caminho os bares da vida. O ônibus para no sinal e, ao olhar para o lado, você vê todas aquelas pessoas com seus copos nas mãos, sentadas, rindo. Mas eu já bebi ontem, você pensa. E hoje ainda é terça-feira. É difícil resistir. Desce tão gelada, refrescante. Só um copinho, você diz. Ainda mais depois de um longo dia de trabalho, eu mereço. Toca a sineta e você desce do ônibus pensando: um diazinho a mais que mal tem?
Essa é uma cena comum que repercute entre as milhares de pessoas que utilizam o álcool como uma forma de desestressar. O problema está quando isso se torna frequente, dia após dia. O consumo excessivo e inadequado pode acarretar na dependência química conhecida como alcoolismo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o consumo de álcool per capita no Brasil aumentou 43,5% em dez anos. Em 2006, cada brasileiro a partir de 15 anos bebia o equivalente a 6,2 litros de álcool puro por ano. Em 2016, a taxa chegou a 8,9 litros. Ainda de acordo com a OMS, um total de 3,3 milhões de pessoas morrem todos os anos pelas consequências do álcool, representando 5,9% de todas as mortes no mundo. Entre as pessoas de 20 e 39 anos, 25% das mortes têm uma relação direta com o álcool.
Para a OMS, os governos têm a responsabilidade de formular, implementar, monitorar e avaliar políticas públicas para reduzir o uso excessivo do álcool. A entidade sugere também regulação de marketing de bebidas, dificuldade de acesso à compra e elevação de impostos como medidas protetoras para diminuição dos números no consumo dessa droga.
O contato com a bebida já começa bem cedo. De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar de 2015, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 55,5% dos jovens brasileiros que estão no 9º ano já tomaram pelo menos uma dose de bebida alcoólica. Entre os jovens que consomem, 21,4% já tiveram episódio de embriaguez. Desses jovens, 13,4% já tiveram problemas com família ou amigos, faltaram às aulas ou se envolveram em brigas por causa do álcool.
As consequências físicas e psíquicas são evidenciadas, causando diversos prejuízos, principalmente na vida social dos indivíduos. Muitos dos dependentes químicos apresentam problemas no trabalho, em casa e comportamento agressivo, levando ao aumento do número de homicídios e acidentes de trânsito. Além disso, as doenças consequentes do uso prolongado são inúmeras, como úlceras e varizes esofágicas, gastrite, cirrose, perda da força muscular, hipertensão (pressão alta), impotência e infertilidade.
Transtornos mentais também são comuns, como a demência de Korsakoff, delirium, transtornos do humor e do sono e disfunção sexual. O uso crônico da bebida alcoólica pode também acarretar em sinais de abstinência pela falta da substância no corpo como tremores, câimbras ou formigamentos, ansiedade, depressão, insônia e irritabilidade.
Por isso, o alcoolismo é considerado uma doença e, como tal, necessita de tratamento. Como prejudica inúmeros órgãos pelo uso em excesso, é necessário estar atento ao diagnóstico precoce e rastreio a partir de exames clínicos e laboratoriais para que a saúde tanto orgânica como mental do indivíduo seja restaurada. É necessária uma atuação conjunta de uma equipe multidisciplinar (médicos, psicólogos) para reinserir essa pessoa num contexto de vida em que o álcool não tenha espaço.
O estímulo a não recaída e a continuidade do tratamento devem ser constantemente incentivados. Fique atento! O alcoolismo tem cura e tratamento. Muitas pessoas não julgam o alcoolismo como doença. Pior que não reconhecer e tratar é subestimar o poder tóxico que essa substância tem para o organismo. Informe-se e escolha viver com saúde!
O autor é patologista clínico e vice-presidente de operações do Labi Exames.
Fonte: https://m.jcnet.com.br/editorias_noticias.php?codigo=254645?utm_source=Whatsapp&utm_medium=referral&utm_campaign=Share-Whatsapp